Nestes ensaios clÃĄssicos baseados na sÊrie televisiva inglesa Modos de ver, exibida em 1972, John Berger revoluciona a crÃtica de arte ao apontar as estruturas de poder presentes no processo de criaçÃŖo de imagens. Se hoje, cinquenta anos apÃŗs a escrita deste livro, ainda Ê preciso reforçar que "uma imagem Ê a recriaçÃŖo ou a reproduçÃŖo de uma visÃŖo" â ou, como afirma Djaimilia Pereira de Almeida em seu prefÃĄcio, que devemos encarar "a visÃŖo enquanto vivificaçÃŖo e a observaçÃŖo da arte como paralela à observaçÃŖo da vida" â, a leitura de Berger, essencial em tempos de propagandas por toda parte, se faz mais urgente do que nunca. O primeiro texto parte da pintura a Ãŗleo, tÊcnica consagrada pela arte europeia. ApÃŗs a reprodutibilidade tÊcnica, tornou-se possÃvel ver trabalhos a Ãŗleo fora dos castelos, igrejas e residÃĒncias privadas a que se destinaram um dia, e, isolados de seu contexto original, eles circulam pelo mundo sem serem de fato compreendidos. Quando se instituiu que eram obras de arte, esses trabalhos passaram a ser interpretados â e mistificados â segundo pressupostos como beleza, verdade e genialidade, os quais eram ditados pelo modo de ver especÃfico de uma minoria social no poder. Em outro ensaio, John Berger aborda a representaçÃŖo da mulher na arte ocidental, apreendendo de que maneiras na tradiçÃŖo do nu o corpo feminino se tornou objeto a serviço do olhar masculino. Com perspicÃĄcia, o autor afirma que o protagonista de um nu jamais Ê mostrado: ele Ê o espectador diante do quadro, para quem as "figuras assumem a sua nudaçÃŖo". Berger esmiÃēça, ainda, as naturezas-mortas, que em seu auge expunham objetos extorquidos por feitorias escravocratas. E nÃŖo se priva de olhar para o impacto da publicidade no sÊculo 20, expondo como ela se vale da tradiçÃŖo artÃstica para explorar os impulsos consumistas de quem a observa. Coletivo, emancipatÃŗrio e com toda a vitalidade da insurreiçÃŖo social dos anos 1970, "Modos de ver" Ê um tratado contra o sequestro do olhar pela imagem na sociedade capitalista e um alerta para a linguagem nÃŖo verbal.